domingo, 5 de julho de 2009

IMBOLC, AS MUITAS FACES DE BRIGID

Após o Solstício de Inverno, as noites começam a ficar menos longas e a luz do sol se faz um pouco mais presente durante os dias frios dessa época do ano. O Solstício é a noite mais longa, o meio do inverno; nele há uma promessa de que a luz um dia voltará. O Imbolc é o fim da estação fria; mais do que uma promessa, é a certeza visível de que o sol, ainda que tímido, está começando a retornar. O Imbolc é, portanto, uma antecipação da primavera; mas ainda é um tempo de precaução e cuidado, pois o inverno não terminou.

A lunação do Imbolc é chamada Lua do Gelo. Na Europa antiga, o fim do inverno representava uma fase particularmente difícil; as temperaturas continuavam baixíssimas; o alimento, não muito fresco, ainda tinha que ser racionado (ou poderia não durar até a primavera); e após quase três meses de longas noites, pouca luz solar, muita neve e confinamento em casa, as pessoas começavam a sentir os sinais de tédio, apatia, irritabilidade ou depressão. Muitos enfermos ou idosos não resistiam à dureza da Lua do Gelo, à vassoura da Deusa que vem varrendo o velho para que o novo possa cobrir a terra na primavera. Em toda a parte, eram celebradas deusas ceifeiras, anciãs ou relacionadas ao submundo: nos países eslavos, havia o dia de Baba Yaga; na Grécia, o retorno de Perséfone do submundo; e em terras célticas, a celebração de Brigid, patrona dos ferreiros e sua arte da forja: o bom ferro, a boa espada tem que passar pelo fogo. Essa é a face anciã (ceifeira!) de Brigid que muitos pagãos de hoje parecem não ver, ou não querer ver. Cuidado, crianças, com a Lua do Gelo...

Era nesse momento difícil (o fim do inverno) que a família ou clã se reunia próximo ao fogo, à lareira - o aconchego da chama de Brigid, deusa mãe e protetora do lar. Era nesse momento que o músico ou contador de histórias era tão necessário: para reanimar as pessoas com canções, poemas e charadas, e manter viva a memória da tribo com histórias e sagas de heróis e ancestrais. Ali estava Brigid, Senhora dos Bardos, na forma de inspiração, criatividade, encantamento, graça.



O Imbolc também era um bom momento para se verificar como estavam as sementes que haviam sido separadas no Samhain e estocadas para o plantio na primavera. Mexer nas sementes (ainda que para segurá-las um pouco na mão), sonhar e fazer planos para o verão e as colheitas era algo que sempre trazia um alento, uma esperança naqueles dias lúgubres. Brigid, deusa das sementes e dos grãos, só poderia mesmo ser filha do Dagda, o maravilhoso deus do Caldeirão do Renascimento, da fartura e da prosperidade, o Deus-Druida, o Todo-Pai. Brigid, deusa-menina, enche a casa de vida, sonhos, alegria.



É tempo de Imbolc no Hemisfério Sul. O Brasil enfrenta mais um de seus invernos recessivos, com muito desemprego, contenção de despesas e tensão social. Assim como os antigos celtas, ainda teremos noites frias e longas pela frente, e veremos estruturas velhas e debilitadas ruírem. Ainda há muita meditação e sacrifício para fazer. Precisamos ser fortes como a espada na forja. Mas a luz do sol já está retornando; em breve a primavera chegará, trazendo-nos bênçãos de renovação, saúde, trabalho e prosperidade.

Texto de Bandruir

Leia mais sobre Brigid em:
Blog O CANTO DOS BARDOS
Uma página dedicada a Brigid
www.bandruir.multiply.com

quarta-feira, 1 de julho de 2009

AVALON, A ILHA DAS MAÇÃS

Nas lendas arturianas, Avalon era uma ilha encantada, guardada por nove feiticeiras, entre elas Morgana Le Fay, a meia-irmã do Rei Artur. Tal como Y-Brasil e outras ilhas lendárias da mitologia celta, Avalon aparecia e desaparecia magicamente em meio às brumas. Foi para lá que Morgana levou Artur quando ele foi mortalmente ferido em sua última batalha.



Embora todas essa lendas tenham sido escritas na Idade Média, com muita influência de outras culturas, são os traços da mitologia celta que predominam nas aventuras de Artur. Ele próprio, às vezes, se parece muito mais com um deus ou um herói celta (como Lugh, Bran ou Fianna) do que um rei mortal. Quanto à Morgana, seu perfil é indiscutível: além de feiticeira e fada (“Le Fay”), seu nome pode ter se originado de uma corruptela do nome da Mórrigan, a deusa celta da guerra, senhora da magia e da transmutação. E quanto a Avalon?

Aval significa maçã, assim como apfel (em alemão) e apple (em inglês), que têm a mesma origem. Avalon é a Ilha das Maçãs. Na Cornualha – terra natal do Rei Artur, segundo algumas versões – o Samhain é chamado de Allantide, ou “festival das maçãs”. Esse grande evento do calendário druídico era celebrado em diversas partes da Europa céltica, e acreditava-se que nessa noite os seres humanos estavam mais sujeitos a sofrer influência de seres feéricos (fadas). O Samhain (Samonios, na Gália, e Hollantide, no País de Gales) era o Ano Novo celta, o início do inverno. A palavra druí (= druida, em gaélico) significa feiticeiro, mago, sábio, vidente.

Segundo o folclore de países como Gales e Irlanda, fadas não envelhecem ou morrem. Seu mundo é caracterizado pela beleza, fartura, juventude, vigor. Os seres feéricos freqüentemente utilizam maçãs para encantar e seduzir os mortais, e a maçã tem o poder mágico de preservar a juventude e o vigor, como no conto celta de Connla e a Donzela Encantada, e na lenda viking da deusa Idun. Hoje os nutricionistas ensinam sobre o valor nutritivo da maçã para a pele, o sangue e os dentes. Mas a sabedoria popular sempre soube disso. Diz o provérbio inglês: An apple a day keeps the doctor away (“Uma maçã por dia mantém o médico longe.”)

Talvez seja exatamente disso que o mundo precise hoje. Renovação, rejuvenescimento, vigor. Como Artur buscando a cura na ilha encantada, ansiamos por um tempo em que a magia retornará, trazendo-nos vida, sedução e encantamento.




Texto de Bandruir (fundadora e diretora da GERGÓVIA Escola de Druidismo e Cultura Celta).