segunda-feira, 29 de junho de 2009

DRUIDISMO HOJE

Sempre que alguém me pergunta qual a minha religião e eu respondo: “Druidismo”, das duas, uma: ou a pessoa me pergunta “O que é isso?”, ou sorri bondosamente, achando minha opção religiosa um tanto quanto exótica.




No primeiro caso, a maioria das pessoas acredita não saber o que é Druidismo; mas ao escutarem a palavra mago, imediatamente pensam em Merlim (das lendas do rei Artur) ou até mesmo no Druida Panomarix (dos quadrinhos e filmes de Asterix, o Gaulês). E embora nenhum desses dois personagens tenha existido, a imagem e o mito deles devem muito às reminiscências de uma religião que de fato existiu um dia: o Druidismo. Mas quem eram os Druidas?


Os Druidas eram os sacerdotes das tribos celtas. Os povos celtas habitaram a Europa central e as ilhas britânicas a partir do século X a C. Tinham atividades econômicas e de subsistência variadas: agricultura, pecuária, comércio, pesca e até caça e coleta de alimentos. Como muitos outros povos antigos, sabiam a fartura e a generosidade da natureza, mas também a escassez e a dificuldade, principalmente nos meses de inverno. Tinham plena consciência de sua dependência dos recursos naturais, do clima e das estações do ano.

Por isso, desenvolveram ao longo dos séculos um sistema de crenças onde os deuses eram a própria natureza: a terra, a água, a fertilidade eram a personificação de Dana, a grande Deusa-mãe, cujo nome é o próprio rio Danúbio; Lyr é o mar, o grande Pai de onde veio a Vida; Lugh, o Brilhante, é o sol, o raio, a luz; Boan, Sequana, Matres e muitas outras deusas eram as águas curativas dos rios que receberam seus nomes. Havia inúmeros deuses-sol, fogo, água, floresta, animais - para os celtas, todo o ambiente natural era sagrado, inclusive o solo onde a tribo vivia: cada árvore, cada rio ou lago tinha uma alma, era vivo e habitado por deuses e espíritos de antepassados e elementais. Como tudo na natureza se encontra dentro de um ciclo contínuo de vida, morte e renascimento, os celtas acreditavam que, após a morte, a alma tornava a viver em outros corpos - algo parecido com o que hoje chamamos de "reencarnação".



Os Druidas eram os sacerdotes dessa religião da natureza. Não construíam templos; preferiam realizar seus rituais em clareiras na floresta, em pântanos e à beira de rios e lagos. Eram embaixadores, filósofos, teólogos, poetas, médicos, videntes, profetas e xamãs. Exerciam suprema autoridade sobre assuntos religiosos, judiciais e legislativos, educavam os jovens e mantinham na memória da tribo a história e a cultura legada por seus ancestrais. Estudavam, entre outras coisas, astronomia e ciências naturais, e seu aprendizado levava cerca de 19 anos. Mediavam conflitos entre tribos, celebravam tratados de paz e embora não fossem obrigados a ir à guerra, em várias ocasiões se envolveram em rebeliões e levantes contra a expansão e a ocupação romana das terras célticas; lutaram contra a escravização dos celtas e a imposição de uma cultura estrangeira. Mesmo perseguidos, os Druidas resistiram, participando ativamente das rebeliões de Vercingentorix e Boudicca, até o massacre final em Mona (atual Anglesey). Tudo pela preservação de sua instituição, sua cultura seu ambiente e seu povo.


Por que, para muitas pessoas, o Druidismo nos dias de hoje parece tão exótico e distante? Mais do que nunca é preciso socorrer e preservar os ecossistemas - o mar, a floresta, os mangues, o deserto, as terras geladas - que se encontram debilitados, vulneráveis e profanados pela ação destrutiva da ambição humana. Mais do que nunca, é preciso trabalhar pela correta distribuição da colheita, pela justiça social, pois com a cruel e crescente desigualdade econômica atual, o mundo jamais encontrará a paz. Mais do que nunca, é preciso encontrar espiritualmente a irmandade com cada habitante deste planeta - seja pessoa, animal, planta ou pedra - por mais diferente que seja. Mais do que nunca, é preciso estudar a História, e saber que, se um dia essas foram atribuições de um Druida, não podem ser menos agora - justamente agora, quando o mundo (nossa tribo!) mais necessita de nós.


E se hoje a aldeia é global, então nós também somos Druidas globais: e responsáveis por todo ser vivente que existe e tornará a existir sobre a Terra. Esse é o legado do Druidismo para os Druidas de hoje.

Texto de Bandruir (fundadora e diretora da GERGÓVIA Escola de Druidismo e Cultura Celta).